Orvalho

Trouxe o
orvalho
azinhavre
ao despertar
das manhãs
metálicas.

Em Torpor Sendo

Não existe fracasso
sem destino,
não há descaso
com o descaso.
Quando a sorte é má
e é de azares que se
perde a vida,
genes entorpecem-se
na sétima parte do
cromossomo sapiens
em sinestesia,
assim o destino do
fracasso pode ser
satisfatório postumamente,
mas não se sabe quando,
ou pode ser hoje,
satisfazendo-se em
psicodelia.

Quem

Não aja isento
o tempo todo,
ao menos uma
vez, seja, e
talvez mude
para melhor
quem você é
para todo o
sempre.
Sempre,
ao menos uma
vez, faça.
Dizem que para
quem tenta
o impossível pode
ser condescendente.

Rock

Nosso amor é uma capa
de disco,
é um refrão gritado
numa canção de melodia
quase sussurrada,
nosso amor é uma banda
de um som difícil de
se ouvir parado,
vai do punk rock ao
heavy metal
passando sempre pelo
som pesado do silêncio
raivoso remasterizado.
Nosso amor é música
de protesto, é punho cerrado,
é sentimento velho
indisciplinado.
Nosso amor é rock.

Ficção

Ensaios de como a vida
deveria ser,
de como o mundo
poderia ser,
bem como de como
nós somos,
como nunca fomos e
ensaios de
como nós jamais seremos.

Eu gosto daqueles que
afirmam o fim,
da vida e do mundo e,
é claro, o nosso fim,
os agentes da destruição,
os ensaístas do apocalipse.

Verdadeira Certeza

Se morrer é
a única
verdadeira certeza
que temos,
eu digo que
prefiro as
dúvidas,
pois são as elas
que me levarão
para os braços
da certeza.

Ofício

Todo dia,
o dia todo.

O vício afinco,
O ofício a fundo,
A regra à força.

Antes o último,
depois o primeiro.

O vício
Ofício
A regra.

Sobre Nós

Antes que desabe,
será que sabe de si,
sabe-se de si,
será, o céu,
percebe-se e sabe
que é dele a chuva,
ou será que chora
sobre nós entristecidos,
nessa noite de lágrimas
essa chuva maravilhosa,
sem dar-se conta que
sangra e sobre nós o
sangue jorra?

Tsunami

Só lágrimas há a
sanguear
por artérias
vermelhas,
como telas de arte
nova sem arte nelas
para propor à vida
pensar,
assim a vida duvida
e faz a certeza
sangrar, e sangra
lágrimas de sais
compativeis com o
DNA do sal do mar
a recuar e recuar,
e recuando a se afastar
apenas para pegar
impulso para toda
a vida fora dele
devastar.

Luz Longe

A solitude
apraz
aos poucos,
cada vez mais
a sociedade
me traz a vontade
de estar a sós,
assim, a anos
luz longe,
assaz distante
de todos.

Frio e Sol

Tantas flores,
frutos, árvores,
florestas, matas
e animais;
Mares, oceanos,
praias.

Desertos,
gelo e areia,
frio e sol;

Homens,
sangue e suor,
d e s t r u i ç ã o
morte e caos.

Re ex

O futuro é a
reencarnação
do passado,
o presente é o
leito do
nascimento e
o momento do
óbito.

Eu queria ser

Eu queria ser
Augusto dos Anjos
e não
Olavo Bilac;
Eu queria ser
Vincent Van Gogh
e não
Pablo Picasso;
Eu queria ser
Machado de Assis
e não
Paulo Coelho;
Eu queria ser
Álvares de Azevedo
e não
Arthur Rimbaud;
Eu queri ser
Raul Seixas
e não
Chico Buarque;
Eu queria ser
Clarice Lispector
e não não ser
Clarice Lispector.

Olhos Acordados

A cor dada
pelo sono para
a insônia
tem matizes
de cores sombrias
da madrugada,
o mesmo tom
está em meus
olhos acordados,
observadores em
silêncio do som
que faz o escuro
da noite profunda
contemplando
aqueles que não
dormem.

Excesso

Não sei se o
que mais me
cansa no criador
do tempo
é a sua obra
prolixa ou se sua
procrastinação.

Replicantes

Eu tenho o talento
mas jamais terei
o dom,
sou talentoso em ser
eu mesmo,
em ser quem sou,
mas nunca terei o dom
de ser outro
como outros têm,
como muitos são.

Nativo

Existem alguns
lugares em mim
que desconheço,
e quando ouso
partir para conhecer
nunca sei se vou
como turista
ou como
forasteiro.

Mas talvez eu não vá lá
e fique por aqui
sendo o mesmo
como eu mesmo sou.

Embriaguez

Álcool e ópio agora
e, depois,
em qualquer hora,
amor e ódio também,
e por qualquer ágora
irei justificar toda
essa minha
determinação.

Surdez Súbita

Absurda quietude afora
e orelha adentro
barulhos da euforia
gritante de pensamentos,
e num obscuro intenso
de um ouvido mudo,
a silhueta da surdez
e o design de um
silêncio único.

Physis Poeta

Physis era filha de um
poeta ufano que morreu
sem compreender o
nada absoluto,
a ciência do todo e a
essência de tudo.

Physis queria muito entender
sobre a natureza do Homem
à dos animais;
da composição das rochas
à da atmosfera;
dos desertos de areia
à dos glaciais.

Saber sobre a genealogia
dos deuses
à morfologia dos insetos.

Saber o que é a luz
e a sombra;
o dia e a noite;
a Música e a dança.

Saber sobre a arte
e o seu propósito.

Saber sobre o cosmos,
o que há no fundo do
universo, do oceano,
e o que existe no
interior profundo
dos vulcões.

Saber sobre a água,
o fogo e todos os
demais elementos.

Entender o vermelho
do sangue,
a ferrugem do ferro,
e a natureza dos
metais.

Physis matriculou-se num curso
intensivo de filosofia, astronomia,
de música, matemática e de
geometria fractal,
devorou livros, dissecou teses,
pôs-se a observar todo o
ao redor de toda a sociedade
de todo o tempo e em ordem
cronológica;
o comportamento humano e dos
demais animais, fez pesquisas,
experimentos, questionou,
argumentou, experimentou
drogas, religiões, freguentou
saraus, clubes, boates, igrejas,
bares e bordéis;
subiu montanhas e
explorou cavernas,
esquadrinhou o planeta.

Ao final do tempo que
determinou para entender
sobre as muitas variáveis
da vida e do mundo,
Physis então percebeu
que suas observações
viraram (viravam) versos,
percebeu que caiu sobre
ela a mesma maldição do
seu malfadado pai,
quando deu por si já
tinha há muito,
infelizmente,
se tornado poeta.

Poema

A felicidade é
muito triste
às vezes,
me disse uma
vez um poeta
feliz.

O Profanador de Estátuas

Tateava o mármore
Como que se a pedra fria
procurasse para ele não
ser pedra fria e sim ser
ardente carne,
louco e dentro de si
assumidamente profano,
invadiu o museu pela
madrugada e dirigiu-se
direto para seu objetivo,
esse devasso profanador
de estátuas, profissional
no seu ofício, logo avistou
a amada de pedra que
retratava a figura de Vênus,
sem perder tempo percorreu
com as mãos e lábios
todo o corpo da escultura e
ficou profundamente
decepcionado quando
percebeu que nela não
havia o orifício do ânus.

Dolo eventual

Morreu a
poesia e
quem a
matou foi
o poeta,
neste poema
se encontram
o defunto e
o assassino
que se declara
inocente,
mas a poética
diz que não.
Matou a poesia
o poeta
ao abrir mão
da inspiração.

Futuro é passado

Todo movimento dos ponteiros
gera um passado,
e quando os ponteiros do
tempo não se movem,
aprisionam o passado
no sujeito
ou o sujeito no passado
que não se importam
com ponteiros nem relógios.
O passado e eu
somos cativos
um do outro,
e o futuro que
se incomode
pelo tempo que
lhe resta.

Desejo

Para a vida
naturista
a morte nua
parece um
traje inadequado,

mas para a
vida vestida
de aflita
angústia e
sofreguidão,

a morte
despida
parece linda
e enfeitiça
aqueles que
por ela sentem
vivo tesão.

A primeira

Quem nasceu
primeiro,
o poeta ou a
poesia?

Dizem que foi
a tristeza
a primeira a
empunhar a
pena,
sendo ela
obra e autor,
é da vida a
única filosofia.

Abismo abaixo

O destino sempre
acha um jeito de
privilegiar os mais
fortes, favorecer
os escolhidos do
berço para a
vitoria,
a vida impulsiona
os melhores,
seleciona os raros,
uma mãozinha,
uma ajuda,
um empurrão.
Este empurrão
em alguns casos
é abismo abaixo.

Altomóvel

Algo fora do comum hoje aconteceu,
um automóvel perdeu o controle sobre
a gravidade e foi parar nas nuvens.
Ninguém sabe ao certo como isso foi
possível, foi como um avião que no
ar por algum problema na aeronave
logo vem ao chão, só que ao contrário,
um carro perdeu contato com o solo
e foi parar no ar, foi lançado ao céu
e agora, preso numa nuvem,
está lá, sobre cabeças curiosas que o
observam sem acreditar no que estão
vendo. Todos se perguntam como
fazer para tirar de lá aquele automóvel.

Ex finge

Decifra-me e eu
te devoro,
leia-me,
leia-me,
leia-me mais uma vez
eu eu lhe darei o poder
de estar triste
quando quiser,
verdadeiramente.

Instagramado

Faces débeis,
feias, falsas,
frágeis,
fáceis de se
assemelharem
e muito a
pasto e reses.

Soneto

Um soneto confesso de que
soneto é, marginal por ser livre
e não metrificado, soneto ele
mesmo sendo ou não soneto é.

Soneto de duas quadras e, é claro,
de dois tercetos, respectivamente,
versos dispostos um por sob o outro
aleatórios a composição da estrofe.

Um soneto simples ou complexo
será sempre um soneto,
ora simples, ora complexo,

ora dirá muita coisa acerca da
existência do ser, ora nada, ora
será só soneto sendo soneto só. 

Ardor amor

Que termine logo ao acabar,
o inverno,
o frio,
a angústia por dias quentes
para fazer frente ao ártico
abaixo de zero do meu sol
que arde acima de mil,

que termine logo ao acabar
a busca,
a espera,
a angústia às custas das
buscas pela espera,
ardor amor,
a angústia que queima,
que queima
como neve.

Fado

Em fado enfático,
contexto poético
em
apático enredo,
demasiadamente
melancólico,
amiúde mesmo e,
superlativo é,
quando abreviado,
enfado.

Empatia

De peito aberto
meu coração anti social,
se põe gravata
vem o nó na garganta,
faz mal parecer igual
a algo que não é,
que nunca foi,
faz mal ser igual,
cópia, o mesmo.

De peito aberto
meu coração é anti social
quando sente-se plagiado,
por isso,
de peito aberto sempre,
porém sempre de corpo
fechado e, alma empática,
só para não parecer
tão igual.

Tanto

Nunca saberei dizer como é
não ser eu,
e esta frase foi escrita
por outro,
num muro erguido por
mim para proteger meu
ego e meus demônios e,
este que escreveu, deve
ser eu mesmo,
único e tanto.

Mente

Rima rica ou
rima rara ou
rima pouca ou
rima errada ou
horrível rima
razoável
mente
rimada. 

Viva voz

Foi encontrado vivo o
corpo do defunto que
havia desaparecido do
cemitério,
assim como foi ouvido
num fonema o descuido
do silêncio em seu
discurso breve,
dizendo que enterrou
todos os ruídos,
proposições e vozes.

Vontade

O peso de todas as possibilidades
está sobre os ombros do talvez,
está como vontade.
Mas ele não está
muito certo disso.

Morto

Entre foices e martelos e dinheiro e
poder e boinas e batinas e cassetetes
e ordem e fardas e normas e regras
e condutas e força e pode e não
pode e deus e o diabo e drogas e
disneys e globo e foda-se e tudo
e o todo e mais e pouco e tendências
e estéticas e eu, indiferente,
desde que eu esteja
morto.

Error in the Mirror

Ódio ardil arde em amor
pela vida que na espécie
humana indubitavelmente
errou. Somos maus,
fétidos e feios, somos
canalhas corrompendo
tudo afora e por deus
corrompidos por dentro.
Se somos imagem e
semelhança,
se eu tiver de ser
lembrado por algo,
que seja por quebrar
espelhos.

Abaixo

Pensando bem a fundo,
flutua todo tipo de tudo
que afunda,
a superfície estranha,
o que antes era sobre
agora é sob, e é por
entre suas entranhas
que o tudo agora
abunda.

Acepção

O amor é Deus
dizendo sim para a
comunhão da
desgraça de existir.

O ódio é o Diabo
dizendo sim para
a eternidade pós vida
a oprimir.